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EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO LIBERALISMO

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO LIBERALISMO

O MESTRE ANTÔNIO PAIM (1927-2021)

Farei, neste ensaio, uma síntese da segunda parte da obra organizada por Antônio Paim (1927-2021) sob o título: Evolução histórica do Liberalismo (2ª edição revista e ampliada. São Paulo: Editora LVM, 2019, 299 pp.). A mencionada obra, na parte escolhida para esta síntese, contou com ensaios escritos por Alex Catharino, Antônio Paim, Francisco Martins de Souza, Gustavo Adolfo Santos, José Osvaldo de Meira Penna, Ricardo Vélez Rodríguez, Ubiratan Borges de Macedo e Ubiratan Jorge Iorio.

Os ensaios sintetizados neste artigo são os seguintes: I - Alex Catharino, “Liberalismo e economia clássica”. II - Antônio Paim, “Emergência da questão social, posição anterior a Keynes e o Keynesianismo”. III - Ricardo Vélez Rodríguez, “A crítica ao keynesianismo”. IV - Antônio Paim, José Osvaldo de Meira Penna e Ubiratan Macedo, “A prova da História e as Perspectivas: o Liberalismo no século XX”. V - Ubiratan Jorge Iorio, “As Escolas Econômicas Liberais Contemporâneas”. VI – Gustavo Adolfo Santos, “As vertentes contemporâneas do Liberalismo Político”.

I - Alex Catharino – Liberalismo e Economia Clássica.

1 – Natureza dos problemas econômicos. Alex Catharino (1974-) destaca, no início do seu texto, que a pobreza é a condição natural da espécie humana. Se nos propusermos a fazer uma análise minuciosa acerca das condições materiais das sociedades que se organizaram ao longo dos mais de seis mil anos de história da civilização, perceberemos que, até o século XVIII, a maior parte das pessoas vivia numa terrível condição de miséria.

Uma investigação objetiva demonstrará que somente devido à Revolução Industrial, com o advento do sistema econômico chamado de capitalismo, o quadro foi revertido. Há uma relação entre o significativo aumento de riquezas criado pela Revolução Industrial no Reino Unido e o surgimento, nesse país, da Ciência Econômica.

Segundo o economista inglês Lionel Robbins (1898-1984), “a economia é a ciência que estuda as formas de comportamento humano resultantes da relação existente entre as ilimitadas necessidades a satisfazer e os recursos que, embora escassos, se prestam a usos alternativos”. A ciência econômica lida com o problema da escassez de meios em face de fins ilimitados.

Os problemas econômicos se dividem em quatro grupos:

• A – Problemas do lado da procura (quais bens e serviços devem ser produzidos).

• B - Problemas do lado da oferta (Como os bens e serviços devem ser produzidos).

• C – Problemas de distribuição (Para quem e em que quantidade bens e serviços devem ser produzidos).

• D – Problemas de crescimento (como aumentar a produção per capita no tempo).

Desde o Mundo Antigo encontramos reflexões morais ou políticas que tangem esses aspectos econômicos (Platão, Aristóteles, Cícero, Varrão, Santo Agostinho, etc.). As principais contribuições, nesse campo, foram dadas pelos pensadores escolásticos, entre os séculos XIII e XVII, que colaboraram para o surgimento da Escola Clássica de Economia.

2 – Origens da Escola Clássica de Economia.

O liberalismo econômico, que constituiu a primeira grande Escola Clássica de Economia, se caracteriza pela afirmação de que a economia de livre mercado é uma instituição fundamental para a garantia dos direitos individuais à vida, à liberdade e à propriedade, sendo um elemento necessário para a tolerância religiosa, o Estado de Direito e o sistema representativo.

Ao longo da Idade Média, encontramos argumentos em favor da livre iniciativa e a questão da justiça. Merecem destaque as obras de Santo Tomás de Aquino (1225-1274) e São Bernardo de Siena (1380-1444), Hugo de São Vítor (1096-1141) e João Duns Scoto (1265-1308). A maior contribuição do pensamento católico à tradição econômica liberal foi a dos autores da Escolástica Tardia Ibérica. Podem ser mencionados, entre muitos outros, os nomes de Francisco de Vitória (1483-1546), Domingo de Soto (1495-1560), Tomás de Mercado (1500-1575), Juan de Medina (1490-1546), Francisco Suárez (1548-1617), etc.

A primeira análise moderna das questões econômicas na Inglaterra foi obra de um médico, filósofo e naturalista, William Petty (1623-1687), que se desempenhou como secretário e discípulo do filósofo Thomas Hobbes (1588-1679). Petty pensava que a riqueza derivava da conjunção da terra (insumos) com a quantidade de trabalho utilizada na produção, enfatizando a divisão do trabalho. Escreveu, em 1676, uma obra intitulada: Politic Arithmetic, que foi traduzida ao francês pelos secretários do Marquês de Pombal (1699-1782) e na qual ele se inspirou para a sua Aritmética Política. Como não falava inglês, o Marquês providenciou, com a ajuda dos seus secretários, uma tradução ao francês da obra de Petty.

O próprio Thomas Hobbes recebeu a influência do seu secretário. O filósofo, no terreno econômico, criticou, paradoxalmente, a intervenção do Estado e defendeu a propriedade privada junto com o livre mercado. Ironicamente, em matéria política, Hobbes foi absolutista, defendendo a obediência de todos ao Estado, para superar o temor da morte violenta provocado pela guerra de todos contra todos. Mas acreditava que entre as variáveis que permitiriam superar a guerra de todos contra todos, estava o restabelecimento firme da propriedade privada. Assim, o Leviatã tinha, entre as suas missões, a de restabelecer a propriedade, garantindo leis seguras que permitissem a prática do mercado.

John Locke (1632-1704), como Secretário do líder parlamentário Conde de Shaftesbury (ligado aos liberais ou Whigs), escreveu Algumas considerações sobre as consequências da redução de juros e do aumento do valor da moeda (1791), a fim de ajudar o seu amigo Sir Isaac Newton (1643-1727) a melhor gerir a Casa da Moeda, da qual tinha sido nomeado Diretor. “Não emitir moeda à toa” foi o conselho de Locke, a fim de que Newton resistisse firme às pressões dos comerciantes que queriam generosas emissões monetárias. Foi esta uma preciosa herança da Economia Clássica Liberal, que firmou a teoria quantitativa da moeda, que relaciona o nível de preços à quantidade de moeda em circulação.

O segundo passo na evolução da ciência econômica foi obra dos fisiocratas. Richard Cantillon (1680-1734) constituiu-se em precursor desta tendência. Ele foi autor da obra intitulada: Ensaio sobre a natureza do comércio em geral (1730). Cantillon criticava os excessos do mercantilismo. Defendia a terra, como uma espécie de base substancial (fýsis, segundo os Gregos) para a riqueza. A posse da terra, fecundada pelo trabalho, daria ensejo ao progresso social. Analisou, também os problemas monetários, as trocas, os juros, o comércio exterior, os bancos e os créditos.

Inserida no contexto do Iluminismo francês, a fisiocracia recebeu grande influência do pensamento sociológico de Charles-Louis de Secondat (1689-1755) Barão de Montesquieu, o qual, no seu livro Do espírito das Leis, defendia o luxo como motor do progresso material e prescrevia que os tributos deviam ser simples e moderados, sustentando, de outro lado, que o livre comércio entre os povos amenizava os costumes e ampliava o processo civilizador.

Os fisiocratas difundiram a célebre máxima “laissez-faire, laissez passer” utilizada pelos liberais contra o abusivo intervencionismo estatal. A doutrina fisiocrática baseava-se em duas concepções: a ideia de “ordem natural” conferida pela natureza (a partir da posse da terra) e o conceito nitidamente econômico de “produto líquido”.

Os principais expoentes da escola fisiocrática foram François de Quesnay (1694-1774), colaborador da Enciclopédie organizada por Denis Diderot (1713-1784) e Jean le Rond d’Alembert (1717-1783). Na obra intitulada Quadro Econômico (1758), Quesnay explicou as relações de produção, circulação e consumo, numa analogia mecanicista com a circulação do sangue. Somente a terra é capaz de produzir algo novo, gerando riquezas, sendo as demais manifestações econômicas (indústria e comércio) simplesmente meios de transformação ou intercâmbio dos produtos da mãe terra. Não deveria haver tributação, a fim de aliviar a vida dos agricultores, artesãos e comerciantes e para facilitar o aumento e a circulação do capital, que deveria ser utilizado em novos investimentos.

Discípulos de Quesnay foram, entre outros, Mercier de la Rivière (1720-1793), Anne-Robert-Jacques Turgot (1727-1781), Honoré Gabriel Riqueti (1749-1791), o conde de Mirabeau, amigo de Luís XVI (1754-1793) e cujo cadáver, enterrado com honras de estadista pelos jacobinos, terminou sendo desenterrado e destruído pela turba enfurecida, quando ficaram sendo conhecidas as tratativas corruptas de Mirabeau junto ao Monarca (para descolar uma grana como consultor econômico ad hoc). Luís XVI seria pouco depois guilhotinado. “Na perspectiva de todos esses economistas liberais – frisa Alex Catharino – no interior de uma ordem natural, tal como a proposta pela fisiocracia, os únicos papéis do Estado, por intermédio da lei civil, seriam o de guardião da propriedade individual privada e o de garantidor da liberdade econômica” [Catharino, “Liberalismo e Economia Clássica”, p. 152].

3 – Formação da Escola Clássica de Economia.

As bases conceituais desta Escola encontram-se nas teorias econômicas do filósofo escocês David Hume (1711-1776), crítico do mercantilismo e defensor do livre comércio. Na perspectiva humeana, para o progresso social são necessários o respeito à propriedade, bem como a possibilidade de transferência daquela por consentimento e a garantia do cumprimento dos contratos. O dinheiro é apenas meio e não fim; os homens o utilizam nas trocas comerciais, sendo o nível geral dos preços determinado pelo equilíbrio entre a moeda circulante e os produtos do mercado.

A maior contribuição do Iluminismo Escocês à tradição liberal consistiu no pensamento de Adam Smith (1723-1790), fundador da macroeconomia. Adam Smith buscou uma explicação racional em relação ao fator que levou o homem, como indivíduo e como espécie, a chegar aonde chegou. O cerne do seu pensamento foi a possibilidade de se conceber uma moral social autônoma em relação às outras esferas do saber, cujo estabelecimento se daria não de forma intencional, mas pelo caminho do consenso social, a partir de um a-priori comportamental inserido na nossa própria natureza.

Ponto epistemológico importante: Adam Smith superou a tipologia do Mercantilismo, que ancorava num esquema “soma zero” da acumulação da riqueza. Para me enriquecer, o único caminho possível é roubar aos outros. A. Smith formulou, pela primeira vez, o esquema da Macroeconomia: para você se enriquecer não precisa roubar dos outros. Você, com a ajuda da sua razão e da experiência, pode criar riqueza e, portanto, abrir a porta para o enriquecimento praticamente sem limites.

4 – Desenvolvimento da Escola Clássica de Economia.

Influenciados por Adam Smith com a sua obra: A riqueza das Nações, outros autores deram continuidade à tradição do Liberalismo Econômico. Os nomes de alguns deles: Jeremy Bentham (1748-1832), Jean- Baptiste Say (1767-1832), Thomas Malthus (1766-1834), David Ricardo (1772-1823), James Mill (1773-1836) e Frédéric Bastiat (1801-1850).

Características comuns a estes autores:

• Fundamentação ontológica, individualista e materialista da economia, aderindo ao realismo.

• Utilização, nessa área do conhecimento, do método hipotético-dedutivo.

• Generalização das proposições econômicas em leis científicas.

• Visão de conjunto da evolução econômica ao longo da história, negando os particularismos.

• Ênfase nos fenômenos da produção.

• Adoção da teoria do valor trabalho, em maior ou menor grau.

• Defesa da livre concorrência, que na maioria das vezes se expressa pela adesão ao laissez-faire.

• Crítica à intervenção estatal na economia.

O que levou à mudança de perspectiva da economia, como ciência que estuda as causas da riqueza das nações, a fim de solucionar a questão da pobreza, foi obra de Benjamin Bentham (1748-1832) e de Thomas Robert Malthus (1766-1834). Daí provém o interesse dos autores por estudar o pauperismo.

A grande revolução na análise do tratamento do problema da pobreza se encontra na obra de Bentham, fundador do movimento utilitarista e criador do sistema ético baseado na noção de amor-próprio e da busca da felicidade, como motores da ação humana.

O maior continuador e difusor do pensamento benthamista foi o filósofo, historiador e economista James Mill (1773-1836), nas suas obras intituladas: Defesa do comércio e Elementos de economia política.

O economista clássico que mais influenciou nos autores posteriores foi David Ricardo {1772-1923), com a sua obra Sobre os princípios da economia política e da tributação (1817).

O mais didático entre os discípulos de Adam Smith foi Jean-Baptiste Say (1767-1832), com a formulação da lei da oferta e da procura: “A oferta cria a sua própria procura”. A sua principal obra é: Tratado de economia política (1803).

5 – Eclipse da Escola Clássica de Economia.

O paradigma da Escola Clássica foi questionado tanto pelos ataques ideológicos, contrários à proposta liberal, quanto por avanços científicos, que reforçaram a defesa consistente do livre mercado.

O primeiro ataque sistemático ao laissez-fairismo de Adam Smith (1723-1790) proveio da obra do economista alemão Friedrich List (1789-1846), com a sua obra intitulada: Sistema Nacional de Economia Política (1841), que divulgou a tese de que a economia nacional era a única força produtiva para o desenvolvimento económico. O comércio é uma soma zero entre vencedores e perdedores e o fator decisivo é o poder nacional do Estado. Tal tese desenvolveu-se no contexto dos totalitarismos comunista e nacional-socialista do século XX.

O outro aspecto que influiu na derrota da Escola Clássica de Economia, foi a chamada “Revolução Marginalista”, fundamentada na ideia segundo a qual o valor econômico de uma mercancia não é alicerçado em fatores objetivos de produção, mas na utilidade marginal subjetiva percebida pelos consumidores. Três autores desenvolveram essa ideia: o economista austríaco Carl Menger (1840-1921) com a sua obra intitulada: Princípios de Economia Política, que influenciou em autores de tendência liberal como Ludwig von Mises (1881-1973) e Friedrich August von Hayek (1889-1992), Murray Rothbard (1926-1995) e Israel Kirzner (1930-).

6 - Algumas leituras recomendadas:

• Luiz Alberto Machado, Viagem pela economia. (São Paulo: Scriptum, 2019).

• Ubiratan Jorge Iorio, Dos protoaustríacos a Menger – Uma breve história das origens da Escola Austríaca. (São Paulo: Editora LVM, 2017).

• Alejandro Chafuen, Fé e liberdade: O pensamento econômico da Escolástica Tardia. (São Paulo: Editora LVM, 2019).

II - Antônio Paim, Emergência da questão social, posição anterior a Keynes e o Keynesianismo.

1 – O contexto da emergência da questão social.

A questão social emerge das mudanças sociais impostas pela Revolução Industrial, que concentrou o operariado nas cidades. (A Inglaterra, com 27 milhões de habitantes no início do século XIX, tinha 4,4 milhões que habitavam nas cidades). Na epidemia de cólera de 1848/49, na Inglaterra, morreram 130 mil pessoas. A solução para as epidemias urbanas (como a cólera) foi equacionada pelo saneamento básico, conseguido inicialmente em Londres pelo Dr. Snow (1813-1858), ao cortar o abastecimento de água contaminada pelo esgoto num distrito central de Londres.

2 – O paradoxo da pobreza.

O fenômeno da pobreza mostrou-se relativo ao grau de desenvolvimento econômico. O contraste dos pobres em face dos ricos aparece mais onde ocorre melhor desenvolvimento econômico, como provou Alexis de Tocqueville (1805-1959) nos seus Ensaios sobre a Pobreza. Frisava a respeito este autor: “Os países que aparecem como os mais empobrecidos são aqueles em que se estima um número relativamente menor de indigentes e, entre o povo mais admirado pela sua opulência, uma parte da população é obrigada a contar com dádivas dos outros para sobreviver”. O “povo mais admirado” pela sua riqueza, segundo Tocqueville, era o inglês.

3 – As primeiras grandes reformas favorecendo os trabalhadores.

Na Inglaterra, os trabalhadores criaram as associações sindicais chamadas de “Trade Unions”, que elegiam trabalhadores para a Câmara dos Comuns, com a ajuda do Partido Liberal. Em 1906 as “Trade Unions” adotaram, nas eleições, o nome de “Labour Party”. Este Partido foi progredindo de forma a eleger, em 1910, 42 Deputados para a Câmara dos Comuns (7% dela). A representação trabalhista foi aumentando e começaram a ser votadas, no Parlamento, leis trabalhistas que beneficiavam a vida dos operários.

Em 1918, o Labour Party incluiu no seu programa o princípio de posse coletiva, pelos trabalhadores, dos meios de produção, o que os afastou dos Liberais. Mas o que é notório foi a aparição, pelo mundo afora, da legislação social, tanto nos Estados Unidos (sendo o porta-voz das reformas o Partido Democrata), como na Europa Ocidental, com o Partido Trabalhista britânico e os Partidos Socialistas Moderados, que prestigiavam as organizações sindicais, tanto na Alemanha como na França e em outros países do Continente.

O “Socialismo Científico” apregoado por Karl Marx (1818-1883) e defendido pelos comunistas foi isolado na Europa, graças às reformas dos sociais-democratas promovidas, na Alemanha, por Eduard Bernstein (1850-1902) e Ferdinand Lassalle (1825-1864) e pelos socialistas moderados ligados aos sindicatos na França.

4 – A revolução teórica promovida por John Maynard Keynes (1883-1946) em face da Economia Clássica Liberal, com as críticas ao Laissez-Faire e com a proposta de intervenção moderada do Estado na economia, foi formulada nas seguintes obras de sua autoria:

As consequências econômicas da paz (1919).

O fim de laissez-faire (1926).

Teoria geral do emprego, do juro e da moeda (1936).

5 – A Doutrina Keynesiana.

O Estado Liberal, considerava Keynes, deveria ser responsável pela manutenção de determinada taxa de ocupação de mão de obra. (Keynes reformulou, assim, a doutrina clássica liberal acerca do emprego). Para conseguir a taxa de ocupação, o Estado Liberal deveria estimular os investimentos (diminuindo a taxa de juros para que as poupanças assumissem, preferencialmente, a forma de inversões).

Os dois defeitos fundamentais da economia capitalista consistiam em não ter alcançado a plena ocupação e em coexistir com uma arbitrária distribuição de renda e das riquezas. Se o Estado assumisse certas atribuições que tradicionalmente pertenciam à iniciativa privada, - pensava Keynes - tratando de influir sobre o comportamento do sistema através da tributação da taxa de juros, por exemplo, conseguir-se-ia regular a questão do desemprego, canalizando o montante obtido, com impostos, para estimular o pleno emprego.

Tratava-se de conseguir a manutenção de todas as vantagens do individualismo (eficiência proveniente da descentralização das decisões, liberdade pessoal), eliminando os seus defeitos. O Estado Totalitário resolveu o problema do desemprego às custas da eficiência e da liberdade. O Estado Liberal deveria livrar-se do desemprego sem perder a eficiência nem a liberdade. Essa era a posição moderada de Keynes.

6 – O impacto do keynesianismo.

O intervencionismo moderado e indireto que Keynes propunha assegurou amplo ciclo de crescimento ininterrupto às economias desenvolvidas, entre 1945 e o início dos anos 70. O período passou a ser chamado de “os trinta gloriosos anos”. Entre 1951 e 1973, os Estados Unidos, a Europa Ocidental e o Japão registraram expansão incessante, segundo taxas anuais médias de crescimento da ordem de 5%. Nos 150 anos precedentes, os economistas calculam que o Capitalismo teve perto de 20 crises cíclicas, uma a cada 6 ou 7 anos e, pelo menos, 30 recessões parciais, processo que culminaria com a catástrofe de 1929.

O enriquecimento da sociedade industrial acarretou a elevação geral dos padrões de renda e a virtual eliminação da pobreza. Nos Estados Unidos, passaram a ser consideradas pobres, aquelas famílias cuja renda anual fosse inferior a 9.862 dólares. A pobreza remanescente correspondia a 14% da população em anos recentes. A renda familiar média situava-se, nos Estados Unidos, em torno dos 25 mil dólares anuais.

Europa Ocidental, Estados Unidos / Canadá e demais países desenvolvidos (Austrália, Nova Zelândia, Japão, Coreia do Sul, etc.) passaram a garantir prerrogativas como:

• Seguro-desemprego (70% do salário) e bolsas para o aprendizado de nova profissão.

• Aposentadoria integral.

• Salário-família (que dobrava do 1º para o segundo filho e do segundo para o terceiro).

• Seguro-saúde (que garantia a reposição de despesas efetivadas com assistência médico-hospitalar).

• Transporte subsidiado.

• Educação gratuita que abarcava a Universidade (como na Alemanha).

• Programas habitacionais.

7 – Leituras recomendadas.

• Jesús Silva-Herzog Flores (1935-2017). Antologia do pensamento econômico-social. 2 vol. (México: Fondo de Cultura Económica, 1963).

• Raúl Prebisch. Introducción a Keynes. (México: Fondo de Cultura Económica, 1965).

• Keynes. Teoria geral do emprego, do juro e da moeda. (Tradução da Editora Abril. Introdução de Adroaldo Moura da Silva. São aulo: Abril Cultural, 1973).

• Ludwig von Mises. As seis lições. São Paulo: Editora LVM, 2017).

• Ludwig von Mises. Crítica ao intervencionismo. (São Paulo: Editora LVM, 2019).

• Ludwig von Mises. Intervencionismo: uma análise econômica. (São Paulo: Editora LVM, 2018).

• Hayek, F. A. O caminho da servidão. (São Paulo: Instituto Mises Brasil, 2010).

III – Ricardo Vélez Rodríguez (1943-), A crítica ao keynesianismo.

1 - Considerados globalmente, os críticos liberais do keynesianismo poderiam ser classificados em dois grupos:

• Os que não reconheciam os méritos de Keynes: Ludwig von Mises (1881-1973), Friedrich Hayek (1889-1992) e Milton Friedman (1912-2006).

• Os que partiam da constatação de que o keynesianismo simplesmente perdeu a eficácia em nossos dias: John Muth (1930-2005), Christian Saint Étienne (1951-), Henri Lepage (1941-), autor dos livros intitulados: Amanhã o Liberalismo (1988) e Amanhã o Capitalismo (1980). Para este grupo de autores, boa parcela do funcionamento da economia se pautava pelas expectativas de agentes que tiravam lições relativamente complexas, a partir da manipulação das informações sobre a conjuntura econômica e as políticas praticadas. Na medida em que esses conhecimentos sofisticados se expandiam nas sociedades, deixando de ser propriedade exclusiva dos agentes governamentais, o seu efeito-surpresa se tornava previsível, perdendo dessa forma a eficácia. A propósito, frisava Lepage: “As intervenções conjunturais produzem hoje, sobre as economias ocidentais, efeitos mais desestabilizadores que estabilizantes” (Amanhã o Liberalismo).

A respeito da pouca racionalidade do intervencionismo keynesiano tradicional, Lepage concluía: “A vida econômica se transforma numa verdadeira corrida de velocidade entre os poderes públicos, que buscam reduzir o desemprego aceitando sempre, a priori, a inflação e os agentes econômicos, que reagem cada vez menos espontaneamente aos estímulos monetários que lhes são aplicados” (Amanhã o Liberalismo).

2 – As teses do “freio fiscal”, como explicação pra a ineficácia das “intervenções racionais”.

Lepage, em Amanhã o Liberalismo, mostrava que dois jovens economistas americanos da sua época, Arthur Laffer (1940-) e Martin Feldstein (1939-2019), chamaram a atenção para o fato de que a pressão fiscal do Estado, típica do keynesianismo, longe de estimular a atividade industrial e o pleno emprego, criou sérios obstáculos à produção e acarretou a depressão econômica. A respeito, poderíamos afirmar com Laffer: “A ideia consiste em lembrar que as nossas políticas de intervenção econômica se alicerçam sobre uma teoria da demanda global, que negligencia o papel das motivações individuais na determinação dos níveis da produção e do emprego”.

Os instrumentos keynesianos de controle econômico tendiam, cada vez mais, a sobre-estimar as necessidades reais de estímulo à atividade produtiva, em virtude do fato de o emprego continuar a ser explicado num arcabouço conceitual que não se adaptava à situação prevalecente no tempo de Keynes e que não correspondia, também à hodierna realidade econômica.

O desempregado deixou de ser a figura carente e frágil que pressupunha a teoria keynesiana e se converteu num indivíduo capaz de programar o seu estado de desemprego, enquanto não aparecesse a atividade econômica mais consentânea com as suas expectativas salariais e profissionais. Dessa forma, as práticas keynesianas se revelaram, nos países desenvolvidos, mais desestabilizadoras do que estabilizantes.

3 – Os modelos econômicos contemporâneos sobrestimam o impacto “multiplicador” do gasto público.

Este fato ocorre na medida em esses modelos não levam em consideração os efeitos das políticas fiscais sobre as motivações individuais, face ao trabalho e à poupança. Ao contrário do que tradicionalmente se pensava, no sentido de que os altos impostos somente afetavam os ingressos mais altos, a realidade econômica atual revela que todo mundo sofre com isso.

Os modelos econômicos de inspiração keynesiana, ao negligenciar os efeitos da tributação crescente sobre as motivações individuais para o trabalho e a poupança, levavam os poderes públicos a menosprezar um instrumento muito válido para efetivar o equilíbrio da economia: a redução do imposto.

4 – O novo modelo de intervencionismo agregado pelos críticos do keynesianismo consiste em fixar regras de gestão estáveis, definidas para períodos mais longos.

Esta solução pressupõe que sejam adotados mecanismos constitucionais que obriguem a que o orçamento do Estado se equilibre globalmente durante o período de uma legislatura completa, de forma a impedir, ao governo, a efetivação de mudanças abruptas nas práticas tributárias. Esta prática obriga a que se fixem limites ao crescimento das despesas públicas, atrelando-as aos índices de crescimento da economia.

Não se trata de duvidar das fórmulas keynesianas, mas de esclarecer que o desenvolvimento dessas técnicas modificou, progressivamente, o universo econômico, em relação ao qual elas tinham sido concebidas. O que antes era eficaz, hoje é fator gerador de efeitos perversos.

5 – Leituras recomendadas.

• Nicholas Wapschott. Keynes X Hayek: as origens e a herança do maior duelo econômico da história. (Rio: Record, 2016).

• Milton Friedman (Prêmio Nobel de Economia, 1976). Capitalismo e Liberdade. (São Paulo: Abril, 1985).

• Milton Friedman. Livre para escolher: Um depoimento pessoal. (Rio: Record, 2015).

• John Kenneth Galbraith (1908-2006). Moeda: de onde veio, para onde foi. (São Paulo: Pioneira, 1983).

• John Kenneth Galbraith. A sociedade afluente. São Paulo: Pioneira, 1987.

• Henri Lepage. Amanhã, o Liberalismo. (São Paulo: Martins / Publicações Europa-América, 1988).

• Henri Lepage. Amanhã, o Capitalismo. (São Paulo: Martins / Publicações Europa-América, 1980).

• Ricardo Vélez Rodríguez. Keynes: Doutrina e Crítica. São Paulo: Massao Ohno Editor / Brasília: Instituto Tancredo Neves, 1999.

IV - Antônio Paim (1927-2021), José Osvaldo de Meira Penna (1917-2017) e Ubiratan Macedo (1936-2007), A prova da História e as Perspectivas: o Liberalismo no século XX.

1 – O eixo do embate.

No século XX, o Liberalismo experimentou algumas provas cruciais e as enfrentou com sabedoria, saindo ainda mais reforçado.

Lembremos, primeiro as conquistas do Liberalismo:

• Correção de rumo na economia liberal tirando-a das crises cíclicas, graças ao funcionamento dos mecanismos de intervenção moderada do Estado, para superar o livre-cambismo e fazer desabrochar o emprego, controlando a inflação.

• O excesso de intervencionismo ensejado pelas reformas keynesianas está sendo enfrentado, corajosamente, com armas fornecidas pelo próprio Liberalismo, no que o líder francês Jean-Pierre Fourcade (1929-) presidente da Comissão de Assuntos Sociais do Senado francês (1983-1998) chamou de A tentação social-democrata, título, aliás, da sua obra de 1985.

O maior embate, contudo, deu-se com as doutrinas socialistas, corajosamente levado adiante pelo líder e pensador inglês John Cam, barão de Hobhouse (1864-1929), que defendeu o direito à livre organização das Trade Unions (sindicatos), nas seguintes obras de sua autoria: Teoria do Conhecimento (1896); A mente em evolução (1901); Democracia e reação (1904); Evolução social e Teoria Política e Liberalismo (1911). Na luta travada por Hobhouse pela imprensa (através de artigos no jornal Manchester Guardian), o estadista fez a defesa da mão de obra não qualificada para que se qualificasse e participasse da vida parlamentar. Foram ideados vários programas de educação popular, visando à democratização da ideia liberal mediante a participação dos trabalhadores no Parlamento.

Eduard Bernstein (1850-1932) e Ferdinand Lassalle (1825-1864), na Alemanha, lutaram, ao longo da segunda metade do século XIX, em prol da participação dos trabalhadores no Parlamento. As reformas sociais promovidas pelos líderes sindicais através do Parlamento, mostraram que essa estratégia estava certa.

Na França, os sindicalistas de índole democrática lutaram pela participação dos trabalhadores na representação política. Os sociais-democratas de outros países da Europa Ocidental, embora tendo abdicado da utopia da sociedade sem classes e tendo incluído, em seus programas, o compromisso com o Estado Liberal de Direito, no entanto ficaram pensando em solucionar a maioria dos problemas transferindo-os à burocracia estatal.

No seio do socialismo surgiram, no entanto, vertentes totalitárias, amparadas doutrinariamente na dupla Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) e Karl Marx (1818-1883). Essas vertentes foram:

O “Despotismo Oriental”, estudado por Karl August Wittfogel (1896-1988). Tratava-se de uma tradição cultural diferente do humanismo ocidental e que tinha as suas raízes na Asia, herdadas do poder total dos Mongóis e da tradição do Império Romano Bizantino, tendo sido essa tendência denominada de “Despotismo Hidráulico” ou “Oriental”.

O “Nacional-Socialismo” na Alemanha e o “Fascismo” na Itália, Partidos de inspiração totalitária de extrema direita, inspirados no pensamento jurídico de Carl Schmitt (1888- 1985) e que foram os principais causantes da Segunda Guerra Mundial.

2 – Principais aquisições doutrinárias.

O Pensamento Liberal registra enriquecimento progressivo, desde John Locke (1632-1704) até os nossos dias. A doutrina liberal coloca um conjunto de questões nucleares, de caráter permanente, ao lado de uma temática que varia no tempo. - As Questões Nucleares são as seguintes:

• Teoria da representação política.

• Encaminhamento do processo de democratização da ideia liberal e da própria conceituação da democracia e do ideal democrático.

• A questão da responsabilidade social dos cidadãos, aquilo que um liberal democrata como Tocqueville denominava de “interesse bem compreendido”.

• A contribuição norte-americana acerca do papel da educação no exercício da cidadania. É a questão denominada por John Dewey (1859-1952) do binômio “Democracia e Educação”, assim entendido pelo pensador estadounidense: “A civilização, em qualquer caso, enfrenta o problema de unir as mudanças em curso em um plano coerente de organização social. O espírito liberal tem sua ideia própria do plano que se requer: uma organização social que torne possível a liberdade efetiva e a oportunidade do crescimento individual da mente e do espírito de todos os indivíduos” [Dewey, Democracia e Educação, 1916]. Outras obras em que Dewey desenvolve este princípio são: Liberalismo e ação social (1935) e Liberdade e Cultura (1939).

3 – Neoconservadorismo: Uma força renovadora.

Cabe creditar aos Neoconservadores a reforma fundamental: a estruturação de um Estado descentralizado, submetido a procedimentos legais firmados pela comunidade. O Liberalismo Conservador sempre se revelou cioso das prerrogativas da sociedade, pois os liberais acabaram cedendo muito ao Estado, perdendo posições para os trabalhistas e social-democratas.

Os Liberais do Partido Democrata, nos Estados Unidos, sob a liderança do Presidente Jimmy Carter (1924-), revelaram fraqueza, incoerência e ingenuidade, diante do expansionismo soviético. A eclosão do Neoconservadorismo foi obra do presidente Ronald Reagan (1911-2004) nos Estados Unidos, da primeira-ministra Margareth Thatcher (1925-2013) na Inglaterra e do presidente Jacques Chirac (1932-2019), na França.

4 - Projeção doutrinária do Neoconservadorismo.

Cinco obras sintetizam o fenômeno do Neoconservadorismo, do ponto de vista histórico e doutrinário:

A mentalidade conservadora, de Russell Kirk (1918-1994).

Conservadorismo: sonho e realidade, de Robert Nisbet (1913-1996).

O movimento intelectual conservador na América, desde 1945, de George Nash (1945-).

A revolução conservadora americana, de Guy Sorman (1944-).

Neoconservadorismo: A autobiografia de uma ideia, de Irving Kristol (1920-2009).

5 – Elemento chave da Onda Conservadora: a reação contra o agigantamento do Estado.

Essa reação recebe também o nome de Neofederalismo, que encontra notável ponto de apoio no movimento migratório em direção ao Texas e ao Sudeste dos Estados Unidos, a partir de 1960. O florescimento econômico dessa região é creditado à ausência de ingerência estatal e dos sindicatos burocratizados, o que libera a criatividade individual.

6 – Projeção doutrinária do Liberalismo.

Em três vertentes, em nível global, se dá essa projeção doutrinária: Filosófica, Sociológica (Teoria política e Sociologia) e Econômica. A Vertente Filosófica é representada por John Dewey (1859-1952), Benedetto Croce (1866-1952), José Ortega y Gasset (1883-1955), Karl Jaspers (1883-1956), Guido de Ruggiero (1888-1948), Robin George Collingwood (1889-1943), Sidney Hook (1902-1989), Karl Popper (1902-1994), Ayn Rand (1905-1982), Hannah Arendt (1906-1975), John Rawls (1921-2002) e Robert Nozik (1938-2002).

A Vertente Sociológica (Teoria Política e Sociologia) é representada por Max Weber (1864-1920), Ralph Dahrendorf (1929-2009), Walter Lippmann (1889-1974), Robert Nisbet (1913-1996), Robert Dahl (1915-2014), Bertrand de Jouvenel (1903-1987), Raymond Aron (1905-1984), Raymond Polin (1910-2001), Maurice Duverger (1917-2014), Isaiah Berlin (1909-1997) e Giovanni Sartori (1924-2017).

A Vertente Econômica é representada por Friedrich Hayek (1899-1992), Milton Friedman (1912-2006), pela Escola Austríaca, pela Escola Monetarista de Chicago, pela Escola das Expectativas Racionais e pela Escola das Escolhas Públicas.

V – Ubiratan Jorge Iorio (1946-) e As Escolas Econômicas Liberais Contemporâneas.

O século XX foi uma era de coletivismo explícito, em que os Estados e seus governantes provocaram o maior número de mortes da história em nome da ideologia. Foi, infelizmente, uma época das mais turbulentas da história da civilização, com duas Guerras Mundiais, os flagelos do Nazismo e do Comunismo, a Guerra Fria e muitos outros acontecimentos perversos. Décadas de cultura intervencionista terminaram enraizando-se na cabeça das pessoas e a crença em “medidas”, “pacotes” e “planos” governamentais passou a ser senso comum.

O autor desenvolve, neste capítulo, de forma muito sintética, as cinco escolas de pensamento econômico que apareceram no século XX. Essas escolas foram: 1 – O Monetarismo da Escola de Chicago. 2 – A Escola das Expectativas Racionais. 3 – A Escola das Escolhas Públicas. 4 – A Escola da Nova Economia Institucional ou Neoinstitucional. 5 – A Escola Austríaca de Economia.

1 – O Monetarismo da Escola de Chicago.

O fundador foi Milton Friedman (1912-2006), Prêmio Nobel de Economia em 1976. Líder do grupo de defensores do livre mercado que surgiu na Universidade de Chicago nos anos 40. Outros representantes desta Escola são: Frank Knight (1885-1972), Aaron Director (1901-2004), George Stigler (1911-1991), Nobel de Economia em 1982, Ronald Coase (1910-1913), Nobel de Economia em 1991 e Gari Becker (1930-2014) Nobel de Economia em 1992. São duas as propostas monetaristas desta Escola:

• A instabilidade da oferta de moeda causada pelas políticas expansionistas ou contracionistas dos Bancos Centrais.

• A estabilidade da demanda da moeda, entendida como a capacidade dos Bancos Centrais para prever sua trajetória futura.

Ubiratan Iorio resume, da seguinte forma, a trajetória das soluções das economias comandadas pelos intervencionistas, segundo a Escola de Chicago: “(...) Quando o governo tem o objetivo de diminuir a taxa de juros e busca esse intento mediante a injeção artificial de moeda na economia, a taxa de juros cai, mas apenas temporariamente e o resultado final é que ela será maior do que era no início do processo. E, naturalmente, o desemprego aumentará. O tiro sairá pela culatra” [“As Escolas Econômicas Liberais Contemporâneas”, p. 222].

2 – A Escola de Expectativas Racionais.

Os principais economistas desta Escola são Robert Lucas Jr. (1937-), Neil Wallace (1939-), Leonard Rapping (1934-1991), Thomas Sargent (1943-), Nobel de Economia em 2011. Ubiratan Iorio resume assim as propostas da Escola Monetarista: “(...) Nem mesmo transitoriamente é possível, para o governo, manter a economia funcionando acima de sua capacidade natural, mediante políticas de ‘sintonia fina’ de natureza keynesiana, pois os agentes econômicos antecipam a inflação futura e a trazem para o presente. Uma das conclusões mais importantes dessa Escola é a conhecida proposição de invariância, segundo a qual as políticas do governo não têm qualquer poder – mesmo no curto prazo – para afetar as variáveis reais da economia, tais como o produto, o emprego e os salários reais (...)” [“As Escolas Liberais Contemporâneas”, p. 227].

A Escola Monetarista causou uma verdadeira revolução nos anos 70, porque sinalizava que as políticas públicas keynesianas eram prejudiciais pois, mesmo no curto prazo, “(...) não produziriam qualquer resultado sobre as variáveis reais – produção e emprego – e seu único efeito seria sobre os preços. O keynesianismo, além de inútil, seria prejudicial” [Iorio, “As Escolas Liberais Contemporâneas”, p. 228].

3 – A Escola das Escolhas Públicas (Public Choice).

O principal representante desta Escola é James McGill Buchanan Jr. (1919-2013), Nobel de Economia em 1985. Publicou, junto com Gordon Tullock (1922-2014), em 1962, a obra intitulada: O Cálculo do Consenso, que sagrou esta Escola. Ubiratan Iorio sintetiza, da seguinte forma, as ideias centrais da “Escola das Escolhas Públicas”: “Basicamente, a teoria foi sendo fundamentada numa redefinição da complexidade das finanças públicas.

O principal não era mais a manutenção de uma corte, mas o estabelecimento de uma espécie de troca entre impostos pagos pelos cidadãos e bens e serviços recebidos por meio das despesas públicas. Transferindo estas mudanças para a política, a democracia não deve substituir a tirania de um rei ou oligarquia pela tirania da maioria, mas servir aos interesses da coletividade e às preferências dos cidadãos” [Iorio, “As Escolas Liberais Contemporâneas”, p. 230].

4 – A Escola da Nova Economia Institucional.

O Institucionalismo surgiu no início do século XX, ao ensejo da influência do economista e sociólogo norte-americano Thorstein Veblen (1857-1929), para quem o comportamento econômico não seria regido por princípios racionais, mas por instintos e costumes, pela luta buscando a riqueza e pela competição do mercado. Os principais representantes desta Escola foram: John R. Commons (1862-1945), Wesley Clair Mitchell (1874-1948), Clarence Ayres (1891-1972) Adolf Berle (1895—1971) e John Kenneth Galbraith (1908-2006).

Com o crescente desgaste do keynesianismo no longo período conservador (1979-1990) de Margareth Thatcher (1925-2013) na Inglaterra e de Ronald Reagan (1911-2004), nos Estados Unidos, a Escola da Nova Economia Institucional passou a ganhar adeptos. Os princípios dela foram reforçados por Douglas C. North (1920-2015) e Robert Fogel (1926-2013) Prêmios Nobel de Economia em 1993, pelo fato de terem renovado a pesquisa em história da Economia, aplicando a teoria econômica e os métodos quantitativos para explicar mudanças econômicas e institucionais. Segundo o Neo Institucionalismo, para analisar a perspectiva econômica de um determinado país, é necessário levar em consideração dois aspectos: as regras do jogo e a qualidade dos jogadores, sendo que esta é condicionada pelas primeiras.

5 – A Escola Austríaca de Economia.

Foi a antiga tradição liberal que deu ensejo à Escola Austríaca, cujas origens históricas foram estudadas por Ubiratan Jorge Iorio, na sua obra, já considerada clássica no Brasil, intitulada: Dos protoaustríacos a Menger: uma breve história das origens da Escola austríaca de Economia (2017). Ali, o autor elenca os autores da Escolástica Tardia que deitaram as bases do que poderia ser chamado de primeiro surto de Liberalismo na Península Ibérica, sendo o padre jesuíta Francisco Suárez (1548-1617) uma das figuras que se destacaram, em Espanha e Portugal, pelo fato de ter formulado a teoria da soberania popular, que inspirou os movimentos independentistas no mundo ibérico e ibero-americano.

Os fundadores da Escola Austríaca são: Carl Menger (1840-1921), Ludwig von Mises (1881-1973) e Friedrich August von Hayek (1899-1992). A respeito das teses básicas desta Escola, Ubiratan Jorge Iorio frisa o seguinte: “Podemos resumir a Escola Austríaca em um núcleo, formado por uma tríade básica – Ação, Tempo e Conhecimento – e três elementos de propagação – o conceito de Utilidade Marginal, a adoção do Subjetivismo e a definição de Ordens Espontâneas”. Iorio elabora uma fundamentação teórica ampla dessa metodologia no seu livro intitulado: Tempo e Conhecimento: a Escola Austríaca de Economia [publicada em São Paulo, pelo Instituto Mises, em 2011].

A Escola Austríaca baseia-se na ideia filosófica de individualismo, em oposição ao conceito de coletivismo. A concepção da economia e da sociedade caracteriza-se pelo denominado “racionalismo crítico”, divergindo, portanto, das teorias econômicas neoclássicas dominantes, baseadas numa ideia positivista da economia e dos fatos sociais. O chamado individualismo metodológico é considerado como a única fonte válida para a determinação das teorias econômicas. A aplicação formal dessa metodologia chama-se praxeologia, a qual visa a definir as leis econômicas válidas para qualquer ação humana. Este é o método posto em prática por Mises. Hayek apresenta, no entanto, uma pequena variável: seriam verdadeiras as leis econômicas que, até prova em contrário, sejam confirmadas pelos fatos reais, independentemente do tempo e do lugar em que tenham ocorrido. Este procedimento é chamado de falsificacionismo.

A praxeologia, frisa Ubiratan Iorio, “(...) supõe o axioma de que o homem age sempre com a intenção de aumentar o seu conforto ou reduzir seu desconforto, respeitando uma escala ordinal de necessidades que nem sempre são objetivas ou racionais. Utilizando o mesmo axioma, conclui (se) que um mercado livre da influência estatal é a forma mais eficiente de suprir as diversas necessidades que surgem numa sociedade, dada a incapacidade do Estado em interpretar corretamente e suprir, com eficiência, as necessidades em constante mutação dos diferentes indivíduos que a compõem” [Iorio, “As Escolas Liberais Contemporâneas”, p. 236].

6 – Leituras recomendadas.

• Luiz Alberto Machado. Viagem pela Economia. (São Paulo: Editora Scriptum, 2019).

• Mark Scousen. The Making of Modern Economics: The Live and Ideas of the Great Thinkers. (London: Sharpe Publishers, 2ª ed., 2009).

• Friedman Milton & Friedman, Rose. Livre para escolher: um depoimento pessoal. (Rio de Janeiro: Record, 2015).

• Friedman, Milton. Capitalismo e Liberdade. (Rio de Janeiro: LTC, 2014).

• Coase, Ronald H. A firma, o mercado e o direito. (Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2ª ed., 2017).

• Iorio, Ubiratan Jorge. Dos protoaustríacos a Menger: Uma breve história das origens da Escola Austríaca de Economia (São Paulo: Editora LVM, 2ª edição, 2017).

• Iorio, Ubiratan Jorge. Dez lições fundamentais de Escola Austríaca. (São Paulo: Instituto Mises, 2013).

• Iorio, Ubiratan Jorge. Ação, tempo e conhecimento: A Escola Austríaca de Economia. (São Paulo: Instituto Mises Brasil, 2ª edição, 2011).

• Ludwig von Mises. Ação humana: Um tratado de Economia. (São Paulo: Instituto Mises Brasil, 3ª ed., 2010).

VI – Gustavo Adolfo Santos (1973-), “As vertentes contemporâneas do Liberalismo Político”.

Embora, como lembra Antônio Paim, a essência da reflexão liberal se projete, nos vários momentos da sua história, sobre o problema crucial que define a dignidade humana, na luta em defesa da Liberdade, no entanto, a reflexão do Liberalismo pode, muitas vezes, - frisa Gustavo Adolfo Santos - levar como sinal que a distingue, alguma das particulares circunstâncias sobre as quais se debruça essa filosofia, como por exemplo, a questão social.

1 – O Liberalismo Social.

O Liberalismo, frisa Gustavo Adolfo Santos, “(...) adquire uma inflexão em geral aludida por meio da alcunha ‘social’ na passagem do século XIX para o século XX, no contexto dos desafios levantados pelos movimentos socialistas e sociais-democratas (...). Os liberais, de fato, sentiram-se chamados a oferecer soluções aos desafios econômicos e sociais das novas condições, sob pena de perderem (como de fato veio a ocorrer durante o período entre guerras) a autoridade moral e a legitimidade diante das suas sociedades” [Gustavo Adolfo Santos, “As vertentes contemporâneas do Liberalismo Político”, pp. 214-215].

José Guilherme Merquior (1941-1991) definia essa reflexão aplicada ao social, como o caminho “de uma preocupação com liberdade de, para uma estima novamente despertada de liberdade para” [Santos, “As vertentes contemporâneas do Liberalismo Político”, p. 245]. Na Inglaterra, na passagem do século XIX para o XX, como frisa Leonard T. Hobhouse (1864-1929), os pensadores liberais “unem às preocupações liberais centrais – com a autonomia humana e a liberdade para escolher e concretizar o próprio projeto de vida -, uma defesa do papel do Estado na garantia de oportunidades iguais, por meio da taxação e da oferta de serviços públicos de educação e assistência social, para que todos, incluindo os pobres, pudessem compartilhar da aventura do desenvolvimento individual” [Santos, “As vertentes contemporâneas do Liberalismo Político”, p. 245].

Nos Estados Unidos, esse viés social da meditação liberal encontra em John Dewey (1859-1952), “(...) do coração da tradição pragmatista norte-americana, um importante representante dessa discussão, ao realizar, em Democracia e Educação, a ligação íntima entre uma sociedade democrática liberal, com seus sujeitos de direitos e deveres cívicos, e um regime educacional que facultasse a todos as capacidades e hábitos de construir seus projetos de vida individuais e sociais, e ao mesmo tempo a motivação de defender a ordem democrática que inclui o espaço de direito dos outros cidadãos. Seu pragmatismo filosófico (...) o levou a uma releitura de vários dos conceitos políticos do liberalismo, como os de individualismo e liberdade, contextualizando-os (...) no processo humano de encontrar e resolver os desafios históricos da sociedade” [Santos, “As vertentes contemporâneas do Liberalismo Político”, p. 246].

Na Inglaterra, John Maynard Keynes (1883-1946) foi quem, de forma mais completa, dirigiu a reflexão social sobre as condições do armistício da Primeira Guerra Mundial e acerca da crise do capitalismo laissez fairista. Sua grande contribuição, frisa Gustavo Adolfo Santos, “(...) foi o desenvolvimento da teoria econômica neoclássica de modo a responder aos desafios do regime capitalista, investigando o potencial de determinadas ações do Estado, no nível da macroeconomia, para a manutenção do nível de emprego, tais como investimentos estatais em áreas estratégicas para mobilizar os agentes econômicos, a disponibilização de crédito e a definição da taxa de juros básica” [Santos, “As vertentes contemporâneas do liberalismo político”, p. 246-247].

Voltando de novo a atenção para os Estados Unidos, encontramos dois representantes da reflexão social liberal: o conhecido filósofo John Rawls (1921-2002) da Universidade de Harvard e o filósofo do Direito da Universidade de Yale (com atuação também em Oxford e na New York University), Ronald Dworkin (1931-2013), com a sua contribuição acerca dos direitos fundamentais. Referindo-se a Rawls, frisa Gustavo Adolfo Santos: “Sua obra principal, Uma Teoria da Justiça (1971), recusa qualquer argumento utilitarista para justificar, em termos de princípios básicos de justiça, os valores de igualdade política e as diversas liberdades que fazem parte do ‘portfólio de direitos’ civis e políticos das sociedades ocidentais contemporâneas” [Santos, “As vertentes contemporâneas do liberalismo político”, pp. 247-248].

Já no que diz relação ao pensamento de Dworkin, frisa Santos: “[a sua concepção é formulada] com foco na igualdade de tratamento e consideração, construindo um sistema em que os indivíduos possuem seus direitos diante dos outros e da sociedade, na condição de ‘trunfos’ ou reivindicações perante a sociedade, que não podem ser suplantadas por outras reivindicações de natureza diversa” [Santos, “As vertentes contemporâneas do liberalismo político”, p. 248].

Acerca da caminhada do Liberalismo Social no Brasil, frisa Santos, destacando a presença avassaladora das práticas autoritárias ao longo da República Velha e depois, durante o ciclo getuliano e no período militar (entre 1930 e 1985): “(...) O liberalismo social ressurge na década de 1970, no diálogo retomado com a tradição liberal anterior por autores como (...) José Guilherme Merquior (1941-1991), Miguel Reale (1910-2006), Ubiratan Borges de Macedo (1937-2007) e o próprio Antônio Paim (1927-2021). O movimento por detrás do seu trabalho caracteriza-se, em geral, por uma retomada cuidadosa da tradição liberal nacional e internacional, seguindo-se o enfrentamento das principais questões políticas (como a qualidade das instituições e práticas de representação) e sociais (como o adequado redimensionamento do welfare state brasileiro, desde as disposições constitucionais até o desenho das diversas políticas públicas” [Santos, “As vertentes contemporâneas do liberalismo político”, p. 250].

Uma observação quanto aos rumos que, nos Estados Unidos, tomou o Liberalismo. Como anota Santos, nesse país “(...) a inflexão do liberalismo social foi de tal maneira influente que o termo ‘liberal’ passou a ser utilizado para caracterizar pessoas, grupos ou posições mais à esquerda do espectro político, que favorecem em geral a expansão da intervenção estatal para garantir maior igualdade econômica, bem como para definir e promover (...) novos direitos para minorias e grupos cujas reivindicações, práticas e valores desviam-se das tradições culturais e religiosas do país. Por isso, nesse país, os defensores do liberalismo clássico, contrário ao intervencionismo estatal, passaram a ser contados entre os libertários (defensores de uma liberdade individual radical e da restrição da autoridade estatal) (...) e até mesmo entre os conservadores (que queriam conservar, além dos valores e saberes tradicionais judaico-cristãos, a tradição de liberdade econômica, uma herança da ética e da antropologia cristãs)”.[Santos, “As vertentes do Liberalismo político”, p. 250].

2 – O Neoliberalismo: a renovação do Liberalismo Clássico no século XX.

Karl Popper (1902-1994), da London School of Economics, austríaco de nascimento e naturalizado britânico, em duas obras (A sociedade aberta e os seus inimigos e A pobreza do Historicismo, ambas de 1945), denunciou as teorias de inspiração autoritária e revolucionária que presumem desvendar o sentido da história, apenas para justificar regimes de controle social e mental. Baseando-se no conceito crítico de falseabilidade de proposições, Popper questiona o caráter científico do saber que pretende desvendar a essência do processo histórico. Propõe, em contrapartida, aderir a uma “sociedade aberta”, caracterizada pela liberdade de pensamento, num contexto de individualismo, abertura intelectual e responsabilidade mútua.

Como já foi anotado acima, no trabalho de Ubiratan Iorio, foi na Escola Austríaca, fundada por Carl Menger (1840-1921), de onde saíram alguns dos maiores defensores do liberalismo econômico, entre os que se contam Eugen von Böhm-Bawerk (1851-1914). Friedrich von Wieser (1851-1926), Ludwig von Mises (1881-1973), Friedrich August von Hayek (1899-1992), Murray Rothbard (1925-1995), Israel Kirzner (1930-) e Hans-Hermann Hoppe (1949-).

3 – Os Libertários Radicais.

Formam parte desta tendência figuras já mencionadas, quando nos referíamos à obra de Ubiratan Jorge Iorio: Ayn Rand (1905-1982), Robert Nozik (1938-2002) e o economista Murray Rothbard (1926-1995). Na obra Anarquia, Estado, Utopia (de 1974) Nozik sugere, segundo frisa Santos, “uma sutil diferença entre uma concepção que entende os direitos como partes de uma situação final a ser alcançada (...) e aquela que ele mesmo defende, segundo a qual os direitos seriam restrições formais à ação dos outros sobre o agente possuidor dos direitos, uma noção baseada no princípio kantiano de respeito a qualquer pessoa como um fim em si mesmo, e portanto inviolável. (...) Para Nozik, os indivíduos são entidades separadas, concretas, (...) que não podem ser sacrificadas em nome dos direitos de outros. (...) Uma distribuição final será justa caso tenha surgido de uma distribuição original (através de princípios justos de aquisição) por meios legítimos” [Santos, “As vertentes do Liberalismo político”, p. 258].

4 – Os Conservadores Liberais e os Neoconservadores.

Gustavo Adolfo Santos caracteriza da seguinte forma a aparição dos Conservadores Liberais: “A tendência de expansão da área de influência e intervenção do Estado, observada nos Estados Unidos e na Europa, na primeira metade do século XX, preconizada tanto pela Democracia Social Fabiana quanto pelo Liberalismo Social, encontrou resistência também entre os que lamentavam a perda das referências espirituais e civilizacionais sobre as quais fora construída a Civilização Ocidental” [Santos, “As vertentes do Liberalismo político”, p. 258].

George H. Nasch (1945-), na obra intitulada: O movimento intelectual conservador nos Estados Unidos desde 1945, cuja segunda edição é de 1996, identificou como pertencentes a esta corrente Richard M. Weaver (1910-1963), John H. Hallowell (1913-1991). Sustentam teses semelhantes alguns conservadores de origem alemã como Leo Strauss (1899-1973) e Eric Voegelin (1901-1985) ou um ensaísta independente como Russell Kirk (1918-1944), com a sua obra intitulada: A mentalidade conservadora (1953). Esse liberalismo conservador encontra afinidade com o pensamento de dois autores do fim do século XVIII e início do XIX, que hoje, certamente, se situariam nas suas fileiras: Edmund Burke (1729-1797) e Alexis de Tocqueville (1805-1859).

O conservadorismo liberal encontrou uma referência importante no filósofo político inglês Michael Oakeshott (1901-1990). Oakeshott critica com força o racionalismo dos que duvidam da existência de um conhecimento tácito de tradições e de valores conservadores, sacrificando valores originários do passado por uma pretensa racionalidade de engenharia social. A contribuição de Oakeshott ao pensamento liberal reside “na ênfase sobre a política liberal entendida como a arte do verdadeiro governo, ou seja, buscar os ajustes mais práticos para (acomodar) as colisões entre indivíduos” [Santos, “As vertentes do Liberalismo político”, p. 253].

Conclusão: um movimento em constante reconstrução.

Pelo fato de ancorar numa ontologia aberta que acolhe todas as dimensões do humano, desde o corpóreo até as mais íntima dimensão espiritual, esse Ur-Ich de que falava Edmund Husserl (1859-1938), com todas as suas expectativas axiológicas, religiosas e metafísicas, o Liberalismo abre-se a uma perspectiva alvissareira que transcenderá tempos e gerações.

Essa é a crença que anima a Gustavo Adolfo Santos na conclusão do seu capítulo, que de forma muito pertinente poderia ser, também, a conclusão geral da obra organizada por Antônio Paim com o título de: Evolução histórica do Liberalismo (Segunda edição revista e ampliada. (Ensaios de: Alex Catharino, Antônio Paim, Francisco Martins de Souza, Gustavo Adolfo Santos, José Osvaldo de Meira Penna, Ricardo Vélez Rodríguez, Ubiratan Borges de Macedo e Ubiratan Jorge Iorio). São Paulo: LVM Editora, 2019, 299pp : “(...) Os liberais têm a seu favor exatamente a capacidade histórica de dialogar com cada situação concreta, bebendo da fonte inesgotável que é a experiência da dignidade tanscendente de cada pessoa humana, capaz de recriar em sua própria história a liberdade e a verdade para as quais é nascida, participando assim de uma trajetória secular e multifacetada na qual está em jogo o sentido do humano” [Santos, “As vertentes do Liberalismo político”, p. 263].

Leituras recomendadas: Três obras são indicadas pelo autor do capítulo, como leituras complementares:

• José Guilherme Merquior, O Liberalismo antigo e moderno [São Paulo: É Realizações Editora, 3ª edição revista, 2014];

• Antônio Paim, O Liberalismo contemporâneo [Londrina: Edições Humanidades, 3ª edição revista, 2007];

• George H. Nash, The Conservative Intellectual Movement in America: Since 1945 [Wilmington: ISI Books, 2ª edição revista, 1996, que será lançado em português pela LVM Editora, de São Paulo].